V Domingo da Páscoa: Jo 13,31-35: Sair ou ficar? O amor decide!

Por: Dom André Vital Félix da Silva, SCJ

A partir deste V Domingo, a Liturgia nos apresenta a nova etapa da nossa caminhada pascal: a preparação para a partida de Jesus (Ascensão), depois de ter instruído os seus discípulos, e a entrega definitiva da missão (Pentecostes). João, nos capítulos 13–17, onde se inserem a perícope de hoje e a do próximo Domingo, faz uma síntese dos principais ensinamentos de Jesus em forma de despedida. Despedida que não significa um “adeus” sem volta, mas uma solene declaração daquilo que Ele fez e ensinou e, por conseguinte, deixa por herança aos seus discípulos: “Dou-vos um novo mandamento”, e que será a garantia da sua presença perene entre eles: “Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns pelos outros”. Quem não aceitar a lição e, consequentemente não aprendê-la, não terá parte com ele: “Se eu não te lavar os pés, não terás parte comigo... Dei-vos o exemplo para que, como eu vos fiz, também vós o façais” (Jo 13,8.15).
Contudo, é preciso reconhecer que só será possível realizar aquilo que o Mestre fez e deixou por herança se permanecermos unidos a Ele, pois afirma: “como um ramo não pode dar fruto, por si mesmo, se não permanece na videira... Se alguém não permanece em mim é lançado fora...” (Jo 15,4.6). 
O Tempo Pascal é por excelência o momento em que a Igreja é chamada a tomar uma consciência mais clara de sua missão, isto é, ser testemunha do Ressuscitado, produzindo muito fruto, pois é assim que manifestará Deus ao mundo: “Meu Pai é glorificado quando produzis muito fruto e vos tornais meus discípulos” (Jo 15,8). Porém, só há uma maneira para que isso aconteça: “permanecendo no amor” (Jo 15,9). Esta será a fundamental prova de que os mandamentos de Jesus são observados e os preceitos do Pai são guardados (cf. Jo 15,10). O evangelho de hoje é introduzido por uma atitude de um discípulo que toma a escandalosa decisão de contradizer tudo aquilo que o Mestre ensinara e fizera. Enquanto Jesus na última ceia explicita o seu desejo de permanecer com os seus, aos quais amou até o extremo, um dos seus opta por abandoná-lo, traí-lo, manter-se longe dele, impedir que a sua missão siga em frente.
No Lecionário (texto oficial usado na Liturgia), encontramos a expressão: “Depois que Judas saiu do cenáculo”. Contudo, em nenhuma outra versão ou tradução, sobretudo no texto grego, faz-se menção especificando de onde ele saiu (até porque o lugar físico onde estão é obvio). João diz apenas por duas vezes (13,30.31) que “Judas saiu” (grego: exelthev, ir para fora). A primeira, quando recebeu de Jesus o pedaço de pão molhado, isto é, a expressão de que fora declarado aceito na comunhão da mesa. Porém, apesar de ter sido admitido à comunhão, Judas optou por “ir para fora”. Rejeitou permanecer com o Mestre e com os seus companheiros, abandonou a luz, entregando-se às trevas: “Era noite”. Não foi excluído arbitrariamente da comunhão, pois o próprio Jesus lhe lavou os pés e o declarou objeto do seu amor, mesmo não tendo tirado a sua liberdade de fazer o que tinha abraçado como projeto: permanecer impuro, por não ter acolhido a Palavra do Mestre.
No início da perícope hodierna, retomando o contexto, João afirma mais uma vez que Judas saiu. “Ir para fora” para Judas, portanto, não significou apenas sair do cenáculo, mas romper com a comunhão de vida e destino do seu Mestre. Apesar de ter conhecido a luz, preferiu as trevas: “porque as suas ações eram más” (Jo 3,19). Apesar de ter caminhado com o Mestre, que proclamou: “Eu sou a luz do mundo. Quem me segue não andará nas trevas, mas terá a luz da vida” (Jo 8,12), optou por compactuar com o príncipe das trevas cujo projeto de morte “já pusera no seu coração” (Jo 13,2). Não aprendeu a lição de que o discípulo não é maior do que o Mestre, mas assumiu a presunção de quem comanda não para o serviço, mas para a morte: “Judas, levando a corte e guardas destacados pelos sumos sacerdotes... Judas, o traidor, estava também entre eles” (Jo 18,3.5). Contudo, “a luz brilha nas trevas, mas as trevas não a apreenderam” (Jo 1,5). A comunhão foi rejeitada, optou-se pelas trevas, mas o amor venceu: “Agora o Filho do Homem foi glorificado e Deus foi glorificado nele”. Numa aparente vitória das trevas, irrompe o verdadeiro vencedor: o amor manifestado como glória de Deus. O tema da glória de Deus (hebraico: kabod, manifestação concreta) já no Antigo Testamento diz respeito às manifestações concretas do agir de Deus, por causa do seu amor eterno (cf. Sl 136). Ver a glória de Deus é testemunhar o que Ele faz (a criação, a libertação, a aliança). A manifestação da glória de Deus alcança o seu ponto alto na Encarnação: “E o Verbo se fez carne e nós vimos a sua glória” (Jo 1,14). Jesus ao iniciar o seu ministério segundo João, “realiza o seu primeiro sinal em Caná da Galileia, manifestou a sua glória e seus discípulos creram nele” (2,11). O novo trazido por Jesus não é dizer que Deus ama e que devemos nos amar, pois o Antigo Testamento está cheio de testemunhos dos prodígios de Deus e das exigências do amor ao próximo (Lv 19,18), mas o novo proclamado por Jesus está no modo de amar: “Não há maior prova de amor do que dar a vida” (Jo 15,13). Esta será a marca inconfundível de quem optou por permanecer nele e com Ele: “Como eu vos amei, amai-vos uns aos outros”. No amar como Ele amou, Deus será glorificado, isto é, se manifestará concretamente. O desafio é, portanto, crer e permanecer para produzir frutos. Contudo, o amor nem se impõe, nem obriga, pois não fecha portas, mas quem ama não vai embora.



Dom André Vital Félix da Silva, SCJ
Bispo da Diocese de Limoeiro do Norte – CE
Mestre em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana